domingo, março 15, 2009

«S. Vicente um Breve Balanço do Século XX» - Dr. Alberto Vieira

O século XX define um momento importante na História do concelho que o retirou do abandono e o projectou para a afirmação no norte e em toda a ilha.
O isolamento a que o Norte foi votado desde o século XV foi paulatinamente desaparecendo de modo que hoje esta é uma realidade que pertence ao passado. Hoje bastam trinta minutos para se alcançar o concelho desde o Funchal quando no século XIX quem o pretende-se fazer necessitava de várias horas. Tudo isto começou em 1914 com a primeira estrada que estabeleceu a ligação por automóvel ao Funchal. Entre 1928 e 1953 montou-se a rede viária e a circulação foi uma realidade, apagando as distâncias aos locais mais recônditos como o Norte. A conclusão deste plano de abertura do Norte ao Sul só resultou em pleno após o 25 de Abril de 1974 já no último ano do milénio com a abertura do túnel que liga a Serra de Água ao Rosário..
A chegada do automóvel matou o vapor costeiro e anunciou o progresso que o novo meio de locomoção foi portador. Tudo isto evoluiu de tal forma que hoje estamos sob a hegemonia do automóvel e todo o progresso de uma localidade se subordina à existência de uma rede viária. E na verdade o concelho dispõe hoje de uma das melhores redes viárias.
Ainda antes do automóvel chegou em 1911 o telefone que permitiu a circulação das notícias de forma rápida e imediata e que foi mais um contributo para encurtar distâncias e amenizar o impacto do isolamento..
O progresso, hoje visível no bem estar das populações residentes, é fruto da luta hercúlea em favor do progresso que marcou o século XX. Esta realidade é mais conquista do processo autonómico do que das anteriores conjunturas políticas. Nem a República, nem o Estado Novo deram olhos às condições de vida dos madeirenses e muito menos os vicentinos.
O abandono isolamento e dificuldades associados à conjuntura da guerra nos anos quarenta conduziram a uma quase sangria populacional com a fuga do campo para a cidade ou a emigração para o Brasil ou Venezuela. Fugia-se da fome, das dificuldades do quotidiano, mas também à falta de condições de apoio na doença e no acesso à cultura. Os médicos eram raros e morria-se em casa ou na rede em viagem desesperada ao encontro de um dos dois concelhios.
As condições de vida das populações não eram as melhores. As casas de habitação careciam de condições e a partir dos anos quarenta as recomendações da câmara apontavam no sentido de uma melhoria das condições de salubridade. O cuidado e a preocupação com a saúde e bem estar dos vicentinos foi um campo de batalha permanente do médico municipal que conduziu à criação de uma rede de fontanários públicos, acabando com o consumo da água da levada, e ao estabelecimento de uma rede de distribuição pública de água que só o 25 de Abril levou a todo o concelho e casas dos munícipes.
A água, em que o concelho sempre foi rico, é fundamental à vida destas gentes e de toda a ilha. O concelho sempre primou pela riqueza deste bem, ao que parece considerado o "petróleo" do século XXI. E desde os anos quarenta sentiu-se a importância desta riqueza para quebrara as assimetrias hídricas do arquipélago. O plano de aproveitamento hidroeléctrico e hidro-agrícola fez assentar em S. Vicente um dos principais pilares. As águas das nascentes e mananciais do concelho foram cedidas a troco de contrapartidas, eu tão pouco corresponderam às promessas, uma vez que a electrificação do concelho só se
concluiu com o processo autonómico. Em1956 o concelho recebeu a primeira iluminação pública de electricidade, mas para a maioria a luz eléctrica continuou a ser uma miragem.
O progresso foi possível através de um conjunto de infra estruturas que melhoraram as condições de sobrevivência das populações, mas também da necessária aposta na educação. Por muito tempo a ilha esteve esquecida e do norte parece que ninguém se lembrou, Apenas em 1947 com a criação da Junta Geral esta se tornou prioritária.. O analfabetismo era generalizado sendo em 1944 de 84% de população e o atraso correspondia a esta medida. Hoje, passados mais de cinquenta anos a realidade é outra.
Ao nível do ensino a mudança aconteceu a partir da década de sessenta. Em 1965 instalou-se um colégio para o ensino secundário que abriu as portas à formação da juventude do norte da ilha. Foi a partir daí que se afirmou na sociedade madeirense uma geração de nortenhos.
Os progressos notados no decorrer dos anos no século XX acompanham o processo de maior intervenção da instituição municipal e a maior capacidade de actuação dos madeirenses através da autonomia atribuída nos anos quarenta. Deste modo podemos dizer que o progresso acompanhou a par e passo a afirmação da autonomia das instituições de poder local e regional.
O poder municipal viveu sempre em casa alheia e sem as mínimas condições. Por outro lado o recinto onde estava instalada a vila não parecia o melhor, estudando-se em 1929 a mudança para o alto do Poiso. Desde a década de sessenta que o projecto dos paços do concelho foi adiada para a década de setenta. A dignificação e afirmação das instituições passa obrigatoriamente pelas condições adequadas ao seu funcionamento. De novo a plena concretização desta ancestral ambição só se vislumbra a partir de 1974.
A população, embora maioritariamente analfabeta, teve sempre presente o sentido de sua responsabilidade e defesa dos seus interesses. Foi isto que vimos, por exemplo, com a revolta de 1924 contra o imposto "ad valorem". As elevadas tributações directas e indirectas foram sempre consideradas por todos como um pesado fardo uma vez que ninguém via os frutos da sua aplicação em benefício de todos, tendo em conta que seguiam para o Terreiro do Paço.
A reclamação das populações ia ao encontro dos seus interesses, numa região onde os recursos eram escassos e o esforço humano muito superior à riqueza gerada.
Um dos aspectos mais assinaláveis deste século e que ficou na memória de todos quantos o viveram e presenciaram foi sem dúvida a quebrada que enlutou a Vargem, levando para a morte 40 dos residentes. Foi uma catástrofe que se abateu sobre S. Vicente e que para além das perdas humanas apagou 100 palheiros e igual número de cabeças de gado, uma das principais fontes de rendimento destas gentes. Neste momento a produção leiteira era uma das actividades mais importantes da economia local. Em 1943 nos 15 postos de desnatação transformaram-se 150.000 litros.
São Vicente sempre foi uma área rica em termos agrícolas. A vinha e os canaviais desfrutavam deste espaço e atraiam a atenção e empenho dos agricultores. O concelho sempre se afirmou como uma região vinhateira. Foi assim no século XIX e continuou pelo século XX, assumindo nos últimos anos, por força da valorização do vinho na economia regional, o papel mais destacado na economia familiar dos poucos agricultores.
O século XX ficará para a História como o momento em que aqui se viveram as horas mais dramáticas, com a quebrada de 1929 ou a guerra de 1939-45. Muitos não conseguiram resistir ao isolamento, dor e miséria e, por isso, saíram em busca de melhores condições noutras paragens. Os que conseguiram resistir foram o alento necessário para que se abrissem as portas do progresso.
Em cem anos que passaram na História do concelho contam-se apenas vinte e cinco de progresso imparável que procuraram compensar os muitos anos de abandono e
letargia. É este contraste entre o último quartel do século e os momentos que o antecederam a característica mais evidente que fez com que S. Vicente entrasse no novo século e milénio sob os auspícios do progresso e da afirmação.
Ao menos para São Vicente não se confirmaram as teses apocalípticas, sendo a entrada no novo milénio triunfal. A autonomia venceu os velhos do Restelo que nos legaram ao abandono e projectou-nos para um futuro de promissão.
A História através deste apelo e memória do passado serve precisamente para chamar à atenção dos presentes do quanto foi feito nos últimos anos em prol do progresso e afirmação de S. Vicente. Rememorar tudo isto é uma questão de justiça, como uma forma de homenagem aos nossos antepassados.

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